Postado em 19 de março de 2019

As vísceras do poder

Autor(a): Humberto Azevedo

A décima-primeira semana do governo Bolsonaro a frente da administração pública traz algumas marcas importantes. No campo da economia, mantendo a toada que vinha sendo implementada pelo governo antecessor, a gestão ultraliberal do ministro Paulo Guedes assistiu com satisfação a primeira grande privatização do atual governo sair dos papel. Tudo bem que às honras pertençam a Michel Temer e Eduardo La Guardia. Mas quem colhe os louros da vitória é a gestão eleita em novembro de 2018. Numa tacada só foram privatizados doze aeroportos de capitais e de importantes municípios do interior das regiões Centro-Oeste, Nordeste e Sudeste do Brasil.

Com a transação, onde o governo esperava uma arrecadação de ao menos R$ 2,1 bilhões, os cofres federais receberão um total de R$ 2,3 bi, num ágio de aproximadamente R$ 237 milhões com os espaços públicos agora sob a responsabilidade da administração privada. O principal lote que envolvia as infraestruturas aeroportuárias de Aracaju (SE), Campina Grande (PB), João Pessoa (PB), Juazeiro do Norte (CE), Maceió (AL) e a joia da coroa, Recife (PE), rendeu exatos R$ 1,9 bi aos cofres federais. Todos estes aeroportos situados em locais estratégicos para a promoção do turismo do país foram comprados pelo conglomerado espanhol Aena Desarrollo Internacional.

Os demais aeroportos, como de Alta Floresta (MT), Cuiabá (MT), Macaé (RJ), Rondonópolis (MT), Sinop (MT) e Vitória (ES) foram adquiridos pela bagatela de R$ 437 milhões pelo conglomerado suíço Zurich Airport Latin America. O resultado da privatização representou uma grande vitória para o governo federal. Os rumos privatistas prometidos durante a última campanha eleitoral parecem que não sofrerão abalos, por mais que no âmbito político a nova gestão ainda engatinhe na busca de formar uma coesa e sólida base parlamentar que lhe dê sustentação.

Neste campo, a administração Bolsonaro vem aos flancos e barrancos. Até o DEM, antigo PFL, legenda que possui três ministros importantes no governo não embarcou ainda nas naus governistas. Tudo por causa de um presidente que não sabe, ainda, e nem saberemos se saberá se comportar como um digno chefe de Estado e de governo. Somados aos arroubos que a cosmopolita base de seus apoiadores faz com que não gostem uns, das ideias dos outros.

Aliado a esses problemas, temos também a indefinição dos nomes – fora do PSL – dos políticos que serão os responsáveis pela condução dos projetos governistas em tramitação no Congresso Nacional, sobretudo, na Câmara dos Deputados. A informação à boca pequena é que o futuro líder da maioria na Casa será o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), ex-líder do governo do ex-presidente Temer e ex-ministro das Cidades do governo da ex-presidenta Dilma Rousseff. Este nome fora definido na última semana num encontro do parlamentar paraibano com o presidente Jair Bolsonaro (PSL), acompanhado e articulado pelo presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que aliás está escancarando, cada vez mais, em declarações que não “suporta” e nem “tolera” o companheiro de partido e ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS).

Tais situações nos intestinos do DEM foram expostas na última reunião que a executiva nacional da legenda organizou esta semana, em Brasília, na sede do partido. Lá parlamentares (deputados e senadores), prefeitos, governadores e graúdos reconheceram que o partido precisa assumir que é governo, entretanto não escondem as inúmeras insatisfações que fazem repelir a ideia de se anunciar como uma legenda bolsonarista. O principal nó da questão não poderia ser diferente: a falta de espaço de gente do partido na estrutura federal do novo governo que começa a ser montado. Uma fonte da legenda falou a este articulista: “De que adianta termos três ministros se não temos liberdade de indicar os nossos nomes de confiança para os cargos que fazem a estrutura funcionar”.

A reclamação dos quase lá governistas não ficam apenas restritas ao rame-rame das indicações de pessoal. Eles não querem apenas distribuição de cargos e liberação de emendas para atender as demandas paroquianas. Querem se consorciar da máquina pública. Se serão governo nas horas boas e, sobretudo, nas horas ruins, querem um governo que tenha foco, que não se perca em temas que apesar de apelos eleitorais, não representam nada mais do que polêmicas e que faz pequenos nichos da sociedade zurrarem. A pretensa base aliada quer oferecer condições para a economia voltar ao trilho. E repudiam as manifestações do próprio governo que só fazem descarrilhar-se numa locomotiva sem freio. E as dúvidas se terão isso é a principal preocupação de um enorme contingente parlamentar que passa ao largo às disputas ideológicas entre direitistas e esquerdistas.

Enquanto isso, o vice-presidente – general Hamilton Mourão – segue sua toada de se desvencilhar do caos pueril que toma conta do núcleo duro do governo no qual integra umbilicalmente. A semana começou com ele sendo destaque no grupo de Lima, no Peru, com representantes de vários países vizinhos que buscam uma saída para a crise venezuelana. Suas falas desautorizam a chancelaria do governo e, sobretudo, os filhos do presidente. O recado de Mourão foi absorvido pelo terceiro filho de Bolsonaro, Eduardo (PSL-SP), que na quarta-feira (13) se elegeu presidente da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados.

Outros dois fatos envolvendo Mourão também foram destaques. Um é o Projeto de Lei Complementar (PLP) 21/19, de autoria do senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), que estabelece novas e uma ampliação das atribuições a serem exercidas pela vice-presidência da República que foi tornado público esta semana. O outro fato foi a excelente entrevista que o general, à paisana e vestido com uma camisa do rubro-negro carioca, concedeu a jornalista Andrea Sadi, em seu programa “em foco”, que estreou neste mês na grade do canal de jornalismo da TV Globo na tevê fechada. Mourão vai assim se deslocando das verves lunáticas do presidente eleito e se portando cada vez mais como uma figura responsável para o momento que o país exige. Na boca pequena, em Brasília, não se pergunta mais se o vice assumirá o governo e, sim, quando é que comandará o Planalto.

(*) Humberto Azevedo é jornalista profissional, repórter free lancer, consultor político e professor universitário em Brasília. Artigo publicado originalmente na edição 1.173, de 16 de março de 2019, do jornal O Vale da eletrônica, de Santa Rita do Sapucaí (MG).

Humberto Azevedo
Jornalista e consultor político
Humberto Azevedo é jornalista profissional, repórter free lancer, consultor político, pedagogo com especialização em docência do ensino superior, além de professor universitário, em Brasília (DF).



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