Postado em 3 de março de 2019

O carnaval dos desencontros

Autor(a): Humberto Azevedo

A nona semana do novo governo federal chega ao fim, enfim, com a maior festa dos trópicos batendo à porta. Esta semana resumiu bem o não funcionamento do novo governo. Os diversos grupos que formam, se entrelaçam e dão sustentação ao que o povo elegeu não conseguem entrar em acordo de jeito nenhum. Agem como alas independentes, numa total falta de harmonia, sem mestre-sala e porta-bandeira levando o estandarte da agremiação Unidos da Quizumba Brasis.

O presidente da Escola soa, ao longe, uma mistura de Castor de Andrade com Anísio Abraão David – os folclóricos dirigentes da Mocidade Independente de Padre Miguel e da Beija-Flor. Claro que sem o charme e o jeito de “bon vivant” de ambos. Parece representar apenas as ligações com o submundo das trevas dos negócios ilegais e malfeitos. Com o seu jeitão tosco já se percebeu que a sua língua não é a mesma falada entre os subordinados. Uma verdadeira Torre de Babel em que mercadistas, militares, olavistas, religiosos e ruralistas tentam, em vão, afinar suas sintonias de instrumentos que não se comunicam entre si.

A semana começou com o colombiano naturalizado brasileiro posto no Ministério da Educação requerendo que as autoridades escolares filmassem seus alunos entoando o slogan da campanha eleitoral do presidente eleito como prova que uma “nova era” se iniciou no país. A ementa não poderia ficar pior que o soneto. Apesar da flagrante ilicitude, reconheceu o erro, desdisse o dito e vida que segue. Tudo continua como dantes no quartel de Abrantes.

O decreto 9.690 publicado no Diário Oficial da União (DOU), de 21 de janeiro, que ampliava o número de servidores com poder de tornar ultrassecreto as informações públicas de suas pastas por 25 anos – e que motivou a primeira derrota governista na Câmara dos Deputados no dia 19 de fevereiro – foi suprimida na edição do portentoso DOU da última quarta-feira, 27 de fevereiro. Afinal 367 deputados votaram não ao referido decreto presidencial. Um número obtido graças a junção dos oposicionistas com os independentes e até mesmo com àqueles que são contabilizados como parlamentares possivelmente aliados ao Planalto.

Não bastasse toda a sorte de desencontro, a repercussão sobre a reforma previdenciária apresentada pelo governo no último dia 20 de fevereiro não poderia ser pior. Até partidos – tal qual DEM e PSDB – tidos como certos na contagem de votos para aprovar a matéria, colocada como fundamental pelas bandas do mercado, se posicionaram veemente contra a inciativa que propõe um verdadeiro saco de maldades contra idosos e deficientes. Ambas as legendas anunciaram que não negociarão os termos da proposta com base na premissa prevista de ampliar o tempo de contribuição dos trabalhadores rurais e a definição considerada por eles cruel de estabelecer novas regras insensatas à concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) pago a todos idosos e deficientes, no valor de um salário-mínimo, àqueles que não conseguiram obter aposentadorias.

Por fim, a nona semana do novo governo instalado a frente da gestão federal – além das muitas dúvidas que ainda pairam sobre o que será privatizado, ou o que será priorizado, como a questão dos inúmeros órgãos federais que são considerados vitais para a pulsão econômica e social de regiões. Passados 60 dias de novo governo o disse e o desdisse parecem ser as únicas coisas consensuais entre aqueles que estão sentados sob a máquina pública. E, agora, para aparar estas arestas foi definido na última terça, 26, que a coordenação entre governo e parlamentares das duas Casas Legislativas se dará pelas mãos e pelas vozes midiáticas da ex-apresentadora da revista Veja e da rádio Jovem Pan, a jornalista paranaense Joice Hasselmann (PSL), que se tornou em outubro de 2018 a deputada federal mais votada de São Paulo, atrás apenas do terceiro filho do presidente eleito, Eduardo Bolsonaro, do mesmo partido. Que, aliás, é tido como o padrinho da indicação do atual ministro das Relações Exteriores, o controverso chanceler Ernesto Araújo, e dono da ideia de recriar a União Democrática Nacional (UDN) para reunir os parlamentares aliados ao governo do pai, Jair “Messias” Bolsonaro.

Humberto Azevedo
Jornalista e consultor político
Humberto Azevedo é jornalista profissional, repórter free lancer, consultor político, pedagogo com especialização em docência do ensino superior, além de professor universitário, em Brasília (DF).



Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Informamos ainda que atualizamos nossa

Estou de acordo