Postado em 21 de fevereiro de 2021

Mirar em Getúlio Vargas

Autor(a): Humberto Azevedo

“Foi consagrado à comemoração do segundo aniversário do Estado Novo. Pela manhã, fui à inauguração de estabelecimentos militares: serviços de transmissões, novos pavilhões no hospital militar etc. Depois o grande almoço neste estabelecimento, com grande número de oficiais e todos os interventores. O ministro da Guerra fez um expressivo discurso pela sua significação política, a que respondi. Assistiram-no, também, todos os interventores que aqui estavam, convocados para a Conferência Econômica. De lá fui ao Catete, recebi e examinei as provas do discurso que devia pronunciar, despachei com o ministro da Aviação e instalei no salão amarelo, numa grande mesa redonda vinda do Conselho Técnico, a Conferência dos Interventores, pronunciando um discurso inspirado no grande inquérito feito pela comissão e fazendo também um resumo das atividades administrativa do ano. Terminada a coonferência, regressei ao Guanabara. Às 9 horas da noite, ouvi pelo rádio a conferência do Campos sobre o dia”.

O parágrafo acima é o relato escrito pelo próprio ex-presidente Getúlio Vargas em seu diário no dia 10 de novembro de 1939, quando em comemoração do segundo aniversário do Estado Novo lançou as bases teóricas do país que conhecemos hoje. Nela, reafirmou “a necessidade de coordenar as atividades do setor público”, ao mesmo tempo em que “delineou as metas [econômicas] a serem alcançadas, fazendo ainda um extenso balanço das realizações do regime [ditatorial] nos diversos setores”. À época, o Brasil encontrava-se num momento de transição entre o modelo agrário que sustentou o país até 1.930 e o início do processo industrializante que era uma demanda da Revolução Liberal que pôs fim a “velha república”.

Este pequeno trecho aponta que os revolucionários do Brasil sempre se aliaram às ciências e ao progresso em suas lutas. A história do processo civilizatório brasileiro aponta sempre neste sentido. Num momento de incertezas profundas sobre o futuro que trilharemos, enquanto nação, isso de certa maneira é aconchegante, quando vemos até os princípios da “redentora” serem rasgados e rompidos por aqueles que se dizem seus discípulos e sucessores. Getúlio Vargas governou o país, em toda sua trajetória, por mais de 19 anos. Sem dúvida alguma foi o presidente mais marcante de toda nossa história republicana. É certo que todas suas gestões foram cercadas de sobressaltos, mas em nenhuma delas, o Brasil deixou de ter um projeto. Projeto que colocava o país na rota das nações contemporâneas e abandonava a proposta fundada pelas caravelas, que estabelecia o continente brazilis a uma colônia agrícola, exportadora de manufaturas e ancorada e sustentada no trabalho braçal de milhares seres humanos escravizados e considerados “sem alma”.

Getúlio Vargas foi revolucionário, ditador e democrata. Migrou da “velha república” para o Estado Novo. Percorreu em suas alianças à direita escravocrata e rançosa até à esquerda trabalhista, que teve importada suas ideias do Reino Unido. Mas foi no centro do espectro político que melhor se desenvolveu. Pela sua mão criou três partidos políticos, que até hoje resumem a barafunda eleitoral em que vivemos. Deus para uns, diabo para outros, Getúlio Vargas ao longo da sua história se apresentou como humano em várias oportunidades quando o país descobria seus erros e seus vícios.

Num momento em que o país se vê perdido sobre a continuidade do projeto de nação inaugurado em menos de um século, mirar em figuras como Getúlio Vargas será necessário para o momento que teremos em breve, no pós apocalipse em que nos encontramos, para que possamos reconstruir o que vem sendo destruído. Resta nos saber quando este pós apocalipse surgirá em nossa aurora.


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje

Humberto Azevedo
Jornalista e consultor político
Humberto Azevedo é jornalista profissional, repórter free lancer, consultor político, pedagogo com especialização em docência do ensino superior, além de professor universitário, em Brasília (DF).



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