Na folia do carnaval
Autor(a): Humberto Azevedo
E o carnaval de 2.020 está aberto. É o segundo da gestão nada ortodoxa do presidente eleito, em novembro de 2.018, por mais de 57 milhões de brasileiros: Jair “Messias” Bolsonaro que continua “messias” apenas para seus milhões de seguidores que correspondem aproximadamente um terço da sociedade brasileira.
Eleito pelo PSL (Partido Social Liberal), hoje ele tenta criar a sua própria agremiação partidária, a “Aliança pelo Brasil” (APB), que pretende reunir um mix do que se tem de mais contemporâneo da sociedade brasileira: uma união do pensamento neopentecostal, a adoração pelas armas de fogo guiadas por agentes de segurança, a defesa das médias e grandes propriedades de terra exportadoras de monocultura (soja, café etc), além – é claro – de contar com a simpatia dos jogadores do mercado financeiro.
Na véspera do carnaval, o presidente que vive fazendo a sua própria folia, iniciou a semana sendo repreendido por 20 dos 27 governadores do país. Segundo os gestores estaduais, é preciso que Bolsonaro aja com “equilíbrio” e “sensatez”, além de se abrir para o “diálogo”. A carta assinada pelos 20 governadores foi uma resposta a provocação do presidente que disse que eles seriam um empecilho para diminuir os impostos sobre combustíveis e, assim, baixar os preços do diesel, etanol e da gasolina.
Os gestores que assinaram a missiva aberta ao presidente governam os estados de MG, ES, RJ, SP, RS, AL, BA, CE, MA, PB, PE, PI, RN, SE, DF, MS, AC, AM, AP e PA. Não assinaram o documento endereçado a Bolsonaro os governadores de GO, MT, PR, RO, RR, SC e TO.
Após a quizumba com os governadores, o presidente – tão espontâneo em suas declarações e sempre convidando os desgostosos ao conflito – resolveu descredibilizar a jornalista Patrícia Campos Mello, da “Folha de S. Paulo”, autora de reportagens que apontariam que a então campanha eleitoral que o elegeu à Presidência da República contou com o apoio logístico de empresas para divulgar notícias falsas contra seus adversários, com declarações sexistas e misóginas. Claro que as reações às declarações presidenciais vieram de tudo que é lado. Até o PSDB do atual e novo ministro do Desenvolvimento Regional, o potiguar Rogério Marinho (o mesmo que avalizou e se tornou responsável pelas novas legislações trabalhistas e previdenciárias), se manifestou contra a fala de Bolsonaro sobre a jornalista que sintetizou o que é o seu governo quando se trata de mulheres e de liberdade de imprensa.
Não bastando, na mesma entrevista em que foi vulgar contra a jornalista Patrícia, da “Folha”, resolveu inadvertidamente levar o caso da morte do miliciano Adriano da Nóbrega, ocorrida em Esplanada – na Bahia, para o Palácio do Planalto ao defender a federalização das investigações contra o acusado de chefiar o “escritório do crime” no Rio de Janeiro, suspeito de matar a ex-vereadora carioca Marielle Franco, do PSOL, e as razões que o levaram a ser assassinado pela Polícia Militar baiana no último dia 13 de fevereiro, durante um confronto com policiais que faziam uma operação contra o tráfico de entorpecentes.
Tal declaração presidencial foi o start para que três partidos da oposição (PT, PSOL e Rede Sustentabilidade) ingressassem no Conselho de Ética do Senado Federal na última quarta-feira, 19, pedindo a cassação do mandato do seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (Sem Partido-RJ), por suas “ligações com milicianos”, incluindo aí Adriano da Nóbrega, com o suposto esquema em que é acusado de ter retido parte do salário dos seus antigos servidores – quando deputado estadual fluminense.
E isso, sem contar, a declaração que o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) – general Augusto Heleno – fez na última terça-feira, 18, durante uma cerimonia realizada no Palácio do Planalto para os também ministros, Paulo Guedes, da Economia, e o também general Luiz Eduardo Ramos, secretário de Governo e responsável pelas relações institucionais da Presidência da República, onde foi flagrado por alguns veículos da imprensa que cobriam o evento presidencial, em que afirma que “não podemos aceitar esses caras [congressistas – deputados e senadores] chantageando a gente o tempo todo. Foda-se”.
A frase dita, a boca pequena pelo chefe do GSI de maneira reservada a colegas do governo, causou uma imediata repercussão entre os parlamentares. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), lamentou que Heleno – “um ministro com tantos títulos” – tenha “se transformado num radical ideológico contra a democracia” e “contra o parlamento”. Já o presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), foi mais categórico e pontuou: “nenhum ataque à democracia será tolerado pelo parlamento”.
Os nervos à flor da pele manifestada pelo general Heleno tem como causa a disputa em que o Poder Executivo trava com o Poder Legislativo por conta do orçamento impositivo aprovado pelos congressistas que tira, pela primeira vez, a primazia e a hegemonia do governo aos recursos federais destinados nas mais diversas ações e obras pelo país e que passariam a depender basicamente dos parlamentares para a sua aplicação.
“O momento, mais do que nunca, é de defesa da democracia, independência e harmonia dos Poderes para trabalhar pelo país. O Congresso Nacional seguirá cumprindo com as suas obrigações”, se manifestou Davi Alcolumbre por meio de uma nota sobre as declarações do general Augusto Heleno.
Em resposta a revolta manifestada pela cúpula do parlamento, o chefe do GSI comentou em sua conta no twitter que mesmo vitima de “mais um lamentável episódio de invasão de privacidade”, “hábito louvado no Brasil”, segundo ele que não pediu – ainda – desculpas por ter acusado os parlamentares de serem chantagistas, sua fala era apenas a sua visão “sobre as insaciáveis reivindicações de alguns parlamentares por fatias do orçamento impositivo, o que reduz, substancialmente, o orçamento do Poder Executivo e de seus respectivos Ministérios”.
Em complemento aos ânimos acirrados de suas excelências, tanto do Poder Executivo, quanto do Poder Legislativo, o líder do PT no Senado – Rogério Carvalho (SE) – apresentou nesta última quinta-feira, 20, um requerimento em que pede que o ministro Augusto Heleno seja convocado, quando é obrigado a comparecer, em sessão plenária daquela Casa legislativa para prestar informações sobre as “chantagens” feitas pelo Congresso ao governo federal.
“A acusação que ele [ministro] fez é muito grave. Ele tem que explicar quem está chantageando. A sociedade não pode ficar com a impressão de que existe no Congresso uma organização fora da norma. Há enormes diferenças entre a pressão política derivada diretamente dos freios e contrapesos de um regime democrático que adota a divisão independente e harmônica entre os Poderes e o nefasto ato de chantagear”, comentou o petista sergipano ao justificar a apresentação do seu pedido para convocar o general Augusto Heleno.
E para encerrar a semana pré-carnavalesca, o ex-governador do Ceará e senador licenciado – Cid Gomes (PDT) – foi alvejado na última quarta-feira, 19, por dois tiros de arma de fogo disparados contra ele quando num gesto tresloucado, guiando uma retroescavadeira, tentava acabar com um motim ilegal de policiais militares, em Sobral – no Sul do estado cearense, que reivindicando mais e melhores reajustes salariais, paralisaram os serviços (prática considerada inconstitucional) e pressionavam os demais colegas de corporação a fazerem o mesmo.
Tal situação foi denunciada pela ex-presidente Dilma Rousseff, que sofreu impeachment em maio de 2.016, como um caso que “pode levar a um ambiente de descontrole e violência no país” e resultar numa “instabilidade política que leva às ditaduras” proporcionando “uma situação propícia a aventuras e golpes”.
Tal caleidoscópio do cenário político brasileiro foi resumido pelo ex-líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), em quatro postagens realizadas por ele, em seu twitter, onde questiona “até quando” o judiciário, a mídia corporativa, os militares e o parlamento vão “ignorar que não vivemos uma situação de normalidade institucional” em que o país, segundo ele, está próximo de consolidar um “projeto de poder autoritário e criminoso”.
“Até quando assistiremos o país ser governado por uma aliança que envolve uma família com notórios compromissos com o crime organizado, e um esquema de proteção institucional e midiático viabilizado com a participação de Sérgio Moro no Ministério da Justiça? Até quando os interesses do mercado justificarão o silêncio e a cumplicidade de setores do empresariado nacional que assistem impassíveis a deterioração do Estado Democrático de Direito e a escalada autoritária promovida pelo bolsonarismo?”, pergunta o parlamentar gaúcho.
* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje