A sensação de geleia geral, ou os vários joguetes jogados na luta pelo poder
Autor(a): Humberto Azevedo
A 16ª semana do novo governo federal eleito por mais de 58 milhões brasileiros se encerrou no último 17 de abril em decorrência da tradicional “semana santa” que lamenta a passagem pela crucificação e comemora a ressurreição que Nazareth viveu a aproximados 2.019 anos atrás.
Apesar de o novo presidente brasileiro ser católico, seu governo que recebe enormes cargas de influência do episcopado pentecostal e neopentecostal recorre constantemente aos temas e fugas religiosas sempre que alguma polêmica – que são muitas – ocorrem para garantir o seu apoiamento difuso junto a sua base extremante variada que envolve segmentos sociais que convergem apenas quanto aos seus antipetismos e antilulismo.
Os setores midiáticos (novos e velhos) repercutiram o tema que lhe é caro, a ofensa à liberdade de imprensa e de expressão. Está certo que por vias diretas essa ação não pode ser associada ao governo. Mas, por tabela, e por vias indiretas, está inteiramente ligada a setores neobolsonaristas que viram no consórcio do novo governo a chance de estabelecer o poder que a “República de Curitiba” vinha galgando.
Fake news
A tomada de posição de boa parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) feita nas últimas semanas para criminalizar os tentáculos das raízes da indústria de notícias falsas que tanto contribui para o clima de segregação que vem afastando ainda mais a sociedade brasileira é uma resposta clara e, evidente, de anos que o lavajatismo abrupto incorreu em suas operações e condenações – muitas delas completamente ilegais – que tanto fomentaram o ambiente atual.
O jogo principal do atual cenário quase distópico da política brasileira passa pela Suprema Corte, mas não é jogado substancialmente ali. E os ministros que assumiram, agora, uma posição firme contra os atropelos à ordem constitucional, não o fazem por convicções. O fazem para evitar que eles sejam tragados na próxima luta pelo poder que o lavajatismo antinacional e que busca o estabelecimento de um novo Status Quo prevaleça. As guerras não são cerebrais, são intestinais.
Castas tupiniquins
Paralelo a isso está o conflito entre as castas tupiniquins pela, ou não, realização da reforma previdenciária que envolve a vida de todos os brasileiros. O confronto armado entre os mercantistas – adoradores de Mamon – com os tecnocráticos que ocupam os assentos do Estado brasileiro é quase um suicídio de ambos. Muito dificilmente haverá um vencedor de um dos lados. E é isso que emperra a realização da reforma no sistema previdenciário nacional. Aí a briga no andar de cima pode favorecer quem vive no andar de baixo dos estratos sociais pátrios.
Chamou a atenção na última terça-feira, 16 de abril, a fala do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara – o deputado “gordinho” Felipe Francischini (PSL-PR), reclamando de alguns de seus pares do mesmo barco bolsonarista, em que ele estava fazendo a sua parte para o avanço da tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 06/19 que pretende estabelecer uma “Nova Previdência”.
O recado, direto e indireto, foi destinado ao líder do governo na Câmara – o deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), que declarou estar em sintonia com o presidente Jair Bolsonaro para definir como regra de procedimento o amplo esgotamento dos debates das matérias defendidas pelo governo. A fala do líder governista e correligionário irritou o filho do ex-deputado federal e atual deputado estadual pelo Paraná, Delegado Francischini, que sonha em ser prefeito de Curitiba. Felipe Francischini tentava diminuir o número de oradores que poderiam discutir a matéria. Fato que não se realizou e que ajudou adiar para a próxima semana a votação da admissibilidade e da constitucionalidade da PEC 06/19.
Reservadamente
Procurado por este colunista, um importante interlocutor do presidente Bolsonaro entre os deputados falou sobre a irritação do presidente da CCJ. Reservadamente disse que “esse menino sabe que nós somos contra essa p…! Estamos c… e andando. Queremos que esta proposta vá para …!”.
O sentimento deste parlamentar não é isolado em boa parte na ainda pequena base bolsonarista que apoia ações do governo. O desejo pela reforma da previdência não é o sonho de consumo dos bolsonaristas. Eles querem muito mais a aprovação do “pacote anticorrupção e ao crime organizado” apresentado pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, o ex-juiz federal Sérgio Moro.
A defesa da reforma previdenciária é muito mais cara, por exemplo, aos onze partidos (Cidadania, DEM, MDB, PP, PR, PRB, PROS, PSD, PSDB, PTB, SD) que integram o chamado “centrão” que reúne 289 deputados. Não à toa, este agrupamento partidário é a base de apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), principal defensor da proposta de “Nova Previdência” encaminhada pelo governo do presidente Bolsonaro. E que rifou, ao centésimo plano, o “pacotão” do Moro, quando ainda na oportunidade chamou o ministro de ter copiado um projeto do ministro do STF Alexandre de Moraes e assumido a autoria.
Apesar de parecer que o “centrão” vem colocando obstáculos a tramitação da proposta, este grupo parlamentar age justamente porque quer aprovar esta proposta e vê nos vários “jabutis” colocados pelos governistas na matéria um indício do quanto ela não interessa ao governo que a produziu para apresentar uma espécie de fatura a ser paga pelo apoio recebido dos rentistas no último processo eleitoral. Fato que já começou a ser devidamente entendido pelos endinheirados.
Tanto é que os movimentos que o vice-presidente do país, general Hamilton Mourão (PRTB), vem fazendo desde que percebeu que atual consórcio comandado pelo capitão parece não ter futuro já foram sentidos pelos apoiadores mais próximos de Bolsonaro. O deputado Pastor Marco Feliciano (PODEMOS-SP) ingressou com um pedido de impeachment contra Mourão. O parlamentar vê “deslealdade” e as “críticas e contraditas sempre públicas” feitas pelo general como argumento para retirá-lo do cargo para o qual fora eleito.
Mas as movimentações de Mourão não são as únicas. Cresce a cada dia, sobretudo no “centrão”, o sentimento que o país “precisa de um governo de verdade”. Para isso estão costurando o apoio a essa empreitada até junto aos parlamentares da oposição. Mas isso, ainda, é tratado com sigilo absoluto.