Contemplar - itinerário para o sentido da vida
Autor(a): Roberto Camilo Órfão Morais
A mudança de época que estamos vivenciando, tem gerado uma crise de sentido, entendida aqui como finalidade, propósito, utopia. - “Qual o sentido da vida?” - Pergunta que atormenta a humanidade ao longo da história, mas que se intensificou ao se generalizar nesse início de século XXI.
Falar em sentido da vida ou, em valor da vida, seria em princípio o mesmo; porém, a crise de valores não se limita em crise de valores morais. É algo de significado profundo, que nos submete às questões como: ‘se vale apena viver?’, sobre ‘qual o valor tem a vida?’. Para o filósofo estoico Sêneca, para viver bem, não basta dispor dos preceitos morais, é preciso ainda ter um objetivo que guie e, anime aqueles preceitos.
A ausência de sentido para vida é um dos grandes males da atual sociedade, permeada por um consumismo desenfreado”, onde tudo é intenso, vazio e raso. Segundo documento da Congregação da Doutrina da Fé (Igreja Católica): ‘Sobre alguns aspectos da evangelização’ (dez,2007): “Viver na obscuridade, sem a verdade acerca das questões últimas, é um mal, que está muitas vezes na origem de sofrimentos e de escravidões dramáticas.”
A atual crise do sentido da vida tem suas raízes na não realização das promessas feitas pela modernidade, em sua aposta absoluta na razão instrumental. Apesar de todo o desenvolvimento tecnológico, nos encontramos em uma sociedade constantemente ameaçada, por guerras, violências, pandemias, mudanças climáticas. Tudo isso causado pela própria humanidade, “os inimigos do homem serão os de sua própria casa (Mt 10, 36)”.
A modernidade, ao negar toda explicação transcendente, em nome de um triunfo do racionalismo – “a morte de Deus”, levou a humanidade a uma crise de sentido, esquecendo-se que somente o infinito pode saciar a sede infinita do ser humano. Em decorrência dessa aposta no racionalismo, presenciamos a profecia do Santo Cura d’Ars: “Virá um dia em que os homens estarão tão cansados dos homens que bastará falar-lhes de Deus para vê-los chorar”.
Conforme o teólogo Clodovis Boff em seu ‘Livro dos Sentidos’, “Para vencer tal abismo, a razão não pode fazê-lo por um salto, mas como por uma ponte. E essa precisa ser construída através de um trabalho lento, bem arquitetado e sempre árduo”. Nessa perspectiva está situado a pertinência da vida contemplativa: um esvaziar-se, ao mesmo tempo, um abrir-se ao absoluto; conduzindo a vivência em valores éticos, como o saber cuidar, a solidariedade e, a cooperação.
A contemplação nos leva a perceber que é o transcendente que dá sentido pleno ao imanente. O transcendente, tomado em uma dinâmica propulsiva de imersão no imanente, onde segundo o teólogo José Comblin, “o definitivo entrou no provisório e é aí que o encontraremos”.
O contemplativo teólogo e paleontólogo, padre Teilhard de Chardin, no decorrer de uma expedição científica, na década de 1930 do século passado, no deserto dos Ordos (China), impossibilitado de celebrar missa, no ‘Dia da Transfiguração’, pôs-se refletir sobre a “Irradiação da presença Eucarística no Universo”, escrevendo o texto: ‘A Missa sobre o mundo’.
De forma mística, no texto, Teilhard Chardin, expõe o transcendente que se revela na imanência: “Senhor, mais uma vez nestas estepes da Ásia não tenho pão nem vinho, nem altar, então eu me elevarei acima dos símbolos até à pura majestade do Real, e vos oferecerei, eu, o vosso sacerdote e sobre o altar da terra inteira, o trabalho e o sofrimento do mundo” (...) “Ao vosso corpo em toda a sua extensão, ao Mundo tornado por vosso poder e por minha fé o crisol magnífico e vivo em que tudo aparece para renascer, eu me entrego para dele viver e dele morrer, ó Jesus!”
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje