Postado em 14 de agosto de 2022

A sociedade do barulho

Autor(a): Roberto Camilo Órfão Morais

 Na sociedade pós-moderna, classificada de diversas maneiras, líquida, do cansaço, do desempenho, vivencia-se uma crise em todos os sentidos: social, econômica, ecológica, política, cultural e religiosa. O modelo de desenvolvimento capitalista que já ocupou 83% do planeta de forma devastadora, tem levado a humanidade a uma real ameaça de extinção.

Para o Teólogo José Antônio Pagola, no chamado progresso, conquistado nos últimos séculos pela modernidade, ocorreu uma destruição de valores, “tudo é pouco para nos sentirmos plenamente satisfeito, valores são substituídos por interesses; o sexo é chamado de amor; o prazer de felicidade; a informação de cultura”.

Segundo a teóloga Maria Clara Bingemer, as consequências dessa sociedade capitalista neoliberal, baseada no consumismo leva a uma crise de sentido, “O risco é reduzir a uma identidade nebulosa, sem laços afetivos firmes, sem referências sólidas, sem alternativas de escolhas e de pertencimento, sem capacidade de decidir sobre a própria vida”.

Na atualidade, nossa consciência está sendo assediada por todo tipo de estratégia mercadológicas, levando-nos ao infarto da própria alma. Esse assédio tem como sintoma uma fuga para barulho estridente. A tirania do barulho tomou conta de todos os ambientes, gerando estresse, afastando cada vez mais as pessoas da empatia, alteridade e justa medida.

Através do barulho, somos todos asfixiados pelo consumismo que não nos permite ser nós mesmos, de contemplarmos a beleza do próprio existir, pois estamos sempre correndo do nada para lugar nenhum. O barulho está dentro das pessoas, que sentem a necessidade de permanecer fora de si.

O viver passou a ter como modus operandi o barulho e,aí, entende-se o porquê de não ser comum entre nós, o hábito da leitura, pois exige, além de um tempo solitário - tranquilo, o silêncio, palavra que se tornou maldita. Privada do silêncio, as pessoas vivem na superficialidade, onde se cuida apenas das aparências.

No barulho as pessoas estão conectadas ao mundo exterior, onde não se cultiva uma vida interior, a existência se torna cada vez mais instável e agitada. Não se encontra um sentido que guie a própria vida. No oposto ao barulho, que é o silêncio, podemos compreender e dar uma finalidade transcendente a nossa existência imanente e efêmera.

Devido ao excesso de barulho, que estamos sendo expostos, nossa consciência, vai se acomodando a não sentir, a não reagir, a não pensar. Conforme o filósofo Byung-Chul Han, para superarmos essa letargia, o silêncio é essencial, ele deixa escutar, “Ele vem acompanhado de uma sensibilidade particular, de uma atenção profunda, contemplativa. A coação atual da comunicação faz com que não possamos fechar os olhos, nem a boca.”.

Os santos e místicos evitam o barulho, sabem o valor do silêncio, pois só nele encontram o que procuram, que é a “hospitalidade do sagrado”. Percebem que o amor nasce preferencialmente do silêncio e, só ele, o leva à plenitude. Mas é importante compreender que não há ‘privilegiados do silêncio’, como explica Alceu de Amoroso Lima; para ele, o bem viver necessita do silêncio: “só nele encontra o caminho para a paz e para a sabedoria, para perdoar, para esquecer e, acima de tudo amar.”


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje

Roberto Camilo Órfão Morais
Professor
Professor de Ciências Humanas do Instituto Federal Sul de Minas - Campus Machado.



Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Informamos ainda que atualizamos nossa

Estou de acordo