Postado em sábado, 19 de dezembro de 2015 às 14:15

Câmara perdeu oportunidade de debater com a sociedade, avalia presidente da OAB em Alfenas

A avaliação é em relação a rejeição dos projetos de iniciativa popular para regulamentação das diárias e redução dos subsídios dos vereadores.


 Alessandro Emergente

A avaliação do presidente da 21ª subseção da OAB/MG (Ordem dos Advogados do Brasil/Minas Gerais), Daniel Murad, é que os vereadores perderam a oportunidade de abrir um debate com a sociedade sobre o desejo manifestado oficialmente por cerca de 8 mil eleitores. Um abaixo-assinado pedia a aprovação de três itens: redução dos atuais subsídios dos vereadores (termo técnico que refere-se a remuneração dos agentes políticos), fixação de data antes da eleição para definir os subsídios dos próximos vereadores e regulamentação das diárias.

Usando argumentos jurídicos, os vereadores evitaram levar para o plenário a decisão sobre o mérito de dois projetos de iniciativa popular, endossados por 8 mil eleitores. Um deles propunha uma lei para regulamentar as diárias e o outro, de emenda à Lei Orgânica, propunha a fixação de um prazo mínimo de 30 dias antes da eleição para definição do subsídio para a legislatura posterior.

Na semana passada, o Alfenas Hoje adiantou que a estratégia dos vereadores era rejeitar os projetos sob argumentação jurídica, evitando o desgaste político de levar a discussão para o plenário em ano eleitoral. Um racha dentro do movimento popular facilitou a estratégia dos vereadores.

Remuneração antes da eleição

No caso da proposta de fixação de prazo antes da eleição para definir os subsídios, a Comissão de Constituição, Legislação, Justiça e Redação Final (CCLJRF) emitiu parecer pela rejeição do projeto. Alegou vício de iniciativa, apontando ilegalidade quanto ao aspecto formal da propositura.

“Ressalta-se que a propositura não apresenta técnica legislativa adequada, a qual não pretendemos supri-la, haja vista que entendemos que a propositura não deve prosseguir o seu trâmite regular devido ao flagrante vício de iniciativa”, diz o parecer ao alegar que a proposta de iniciativa popular não condiz com o requerimento acompanhado do abaixo-assinado para redução dos subsídios. 

Os vereadores Hemerson Lourenço de Assis (Sonzinho/PT), Antônio Carlos da Silva (Dr. Batata/PSB) e José Carlos Morais (Vardemá/Pros) integram a CCLJRF e assinaram os pareceres contrários as proposições de inciativa popular (Fotos: Alessandro Emergente/Arquivo)

Um dos argumentos utilizados pela Comissão é de que a matéria e polêmica e já é alvo de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin). A ação questiona uma lei aprovada em 2012, pela Câmara Municipal de Alfenas que fixou os subsídios dos atuais vereadores em R$ 8 mil na época – o valor atualizado chega a R$ 9,6 mil. A votação foi logo após a eleição, motivo que originou a ação. 

Diárias

Em relação ao projeto de lei para regulamentação da concessão de diárias para os vereadores, a CCLJRF emitiu parecer desfavorável à aprovação da proposta. O argumento utilizado foi de que já existe legislação sobre o tema, ou seja a Lei Municipal n˚ 4.331/2011, regulamentado por uma resolução, assinada pela atual presidência em setembro deste ano. “Manifestamos desfavoravelmente à aprovação do projeto de lei n˚ 71/2015 por considera-lo inoportuno”, afirma o parecer. 

Sobre a redução dos subsídios, trata-se de um requerimento, ou seja uma solicitação para que a Câmara Municipal coloque o assunto em debate. A iniciativa foi devido ao entendimento jurídico que esse tipo de proposição não pode ser de iniciativa popular e, por isso, optou-se por um pedido, endossado por 8 mil assinaturas.

Por se tratar de uma solicitação, o requerimento não precisa ser analisado pelas comissões, o que só ocorreria se a Mesa Diretora acatasse a demanda e propusesse um projeto de lei. Com isso, ainda não houve manifestação formal direta em relação ao requerimento.

Oportunidade perdida

Na avaliação de Murad, que opinou como jurista e presidente da OAB em Alfenas, as propostas (regulamentação das diárias, fixação de subsídios para a legislatura posteriores antes das eleições e requerimento de redução de subsídios) propiciavam uma oportunidade para que os vereadores abrissem um debate com a sociedade. Porém, avalia, a Câmara Municipal perdeu essa oportunidade ao decidir de forma unilateral sobre os pedidos endossados por cerca de 8 mil eleitores.

Murad lembra que a OAB tem por finalidade e tradição manifestar-se sobre as questões jurídicas relevantes, de interesse da sociedade. “Em Alfenas não é diferente e temos nos posicionado com clareza em defesa da sociedade e da boa aplicação das Leis”, diz o advogado que foi um dos incentivadores do movimento que coletou as assinaturas. 

O presidente da OAB em Alfenas, Daniel Murad, foi um dos principais incentivadores das propostas de iniciativa popular (Foto: Alessandro Emergente/Arquivo)

O representante da OAB lembra que a questão comporta discussões jurídicas, mas alerta que a Constituição Federal garante o direito de petição e o poder público deve manifestar-se quando provocado. “Se qualquer cidadão pode peticionar aos órgãos públicos solicitando providências, imagine oito mil cidadãos?”, diz.

“O que se pretendia era provocar a Câmara a tratar da questão. Que é sua competência não se discute. Mas deve responder ao povo porque não elabora projeto para redução dos salários dos vereadores, conforme desejo de parte, no mínimo, bastante significativa da sociedade”, cobra em uma nota divulgada à imprensa.

Em dos trechos da nota, Murada esclarece que a diretoria da OAB, por maioria, decidiu não entrar no mérito de apoiar ou não a questão, mas apoia a iniciativa popular e que seja realizado um debate. “Eu ainda espero bom senso dos vereadores para discutir a questão, até porque o Juiz dos fatos será o povo de Alfenas, a tempo e modo”, escreveu.

Diárias

Sobre as diárias, analisa que a legislação existente, com leis aprovadas em 2001 e 2011, não são suficientes. “A Lei 4.311 (de 2011) foi feita visando regularizar as diárias anteriores, sendo utilizada como matéria de defesa por alguns vereadores que enfrentaram ações civis públicas para devolver aos cofres do município, diárias impropriamente recebidas e tidas como abusivas pelo Ministério Público”, argumenta.

Em outro trecho, reconhece avanços recentes na concessão de diárias. “É elogiável que a Câmara venha reduzindo o uso indiscriminado das diárias, o que é mérito também da cobrança por parte da sociedade e da imprensa”, opina.

Sobre argumento de que já existe legislação sobre a concessão de diárias, Murad rebate e diz que tal argumento da CCLJRF não pode prosperar “em hipótese alguma”.

“Se o fato de existir uma legislação sobre o tema impedisse sua revogação com adoção de novas leis, não teríamos inovação legislativa. O mundo é dinâmico e o direito deve acompanhá-lo (...) Com todo o respeito, mas argumento não convence. O projeto merecia discussão mais aprofundada, inobstante a Câmara seja soberana para aprovar seu mérito ou não”, diz.

Sobre a fixação de um prazo, antes da eleição, para definir os subsídios da próxima legislatura, diz que objetivo é impedir “barganha ou retaliação”, com votação dos valores quando já se conheçam os eleitos e ainda fazer com que a população possa saber a posição do vereador antes de reelegê-lo.

Murad diz ainda que para muitos juristas, a correta interpretação da Constituição Federal já é no sentido de que a fixação dos subsídios deve ser feita antes da eleição. No âmbito municipal, a Lei Orgânica, avalia, poderia fixar com clareza tal limite, evitando discussão. “Tal prática é aconselhável, aliás”, explica.

Confira na íntegra a nota assinada pelo presidente da 21ª subseção da OAB/MG 



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