Postado em 6 de junho de 2023

Religião e fanatismo

Autor(a): Roberto Camilo Órfão Morais

 Autor(a): Eder Vasconcelos*

Hoje a religião está em alta, pois a maioria dos conflitos atuais tem um transfundo religioso. Há diversos pensadores que falam do retorno da religião em tempos otimistas e pessimistas. A religião como se sabe constitui uma força central e é umas das construções mais ancestrais da história da humanidade. Ela trabalha com o divino, com o sagrado, com o espiritual. Mas ela não é o espiritual. A espiritualidade é baseada na consciência, a religião no conhecimento.

É crucial uma educação que ajude a religião a não perder a sensibilidade para o mistério de Deus e de cada pessoa. Para não perder o sentido da sacralidade da vida. A educação, o conhecimento e a reflexão podem ajudar a religião a não se tornar um canteiro de fanáticos. Assim é mister resgatar o sentido da palavra religião. Para o filósofo sul-coreano, Byung Chul Han, a “religião como religare é ao mesmo tempo relegere, prestar atenção. De modo que o templo se distingue do museu”. Além de reler, tecer, atar a religião deve manter o foco na atenção para não cair na distração, na inércia e na fanatização.

A palavra fanático vem do latim fanaticus. Tendo significado inicialmente “aquele que se diz inspirado pelos deuses”, originalmente relativo a um templo, fanum. O termo adquiriu posteriormente outro significado: “aquele que tem uma admiração excessiva, exagerada por alguém ou alguma coisa”. Além da admiração excessiva o fanático é alguém que não muda de ideia e não consegue mudar de assunto. O fanático vive num estado psíquico de devoção cega, rígida e irracional. Ele defende suas “verdades” com tanto fervor que, por vezes, flerta com o delírio. Vive num estado bipolar, isto é, num estado de euforia que vai de um extremo ao outro.

Nestes tempos de fanatismos é de suma importância refletir, conversar, debater sobre este assunto. Ele pode estar dentro de casa, nas igrejas, nas comunidades, nas escolas, no trabalho etc. O fanatismo afeta todas as religiões do Planeta. É um fenômeno no seio das tradições religiosas. O fanatismo em qualquer situação deixa a pessoa cega e surda. Ela perde a capacidade de ouvir e ver a realidade tal como ela se apresenta. Mergulhada nesse quadro entre convicção e delírio ela busca autoafirmar-se. O fanatismo tem se mostrado muito potente na era chamada de pós-verdade, para não chamá-la por seu verdadeiro nome: era das grandes mentiras. Nesta era muitos desejam implantar a cultura do ódio, da barbárie e da intolerância.

O fanático não duvida. Tem apenas certeza. O fanático se considera infalível. É impossível convencê-lo de alguma coisa. Ele rompe com a razão para se alimentar da crença sem bases sólidas. Ele despreza a ciência. Vive num estado de miopia e completa alienação. O fanático é, por definição, um ignorante não por falta de acesso ao conhecimento, mas, muitas vezes, por recusa intencionada ao mesmo.

Portanto, uma religião que não educa seus membros para as sutilezas do mistério mergulha facilmente no fanatismo obsessivo, extremista e intolerante. Voltaire dizia: “O fanatismo é um monstro que ousa dizer-se filho da religião”. Ele é uma anomalia, uma atrofia dos princípios e valores da religião. Os fanáticos acreditam que são proprietários de Deus e dispõem dele a seu bel-prazer. Isso não deve intimidar ninguém. É preciso deixar Deus ser Deus. Ele não é propriedade de nenhuma religião. Deus não tem religião. Ele é o Totalmente Outro.



*Artigo escrito em parceria com Eder Vasconcelos, que é franciscano, escritor, teólogo e filósofo. É autor de diversos livros, entre eles, Pedagogia do Silêncio, da Editora Paulinas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje

Roberto Camilo Órfão Morais
Professor
Professor de Ciências Humanas do Instituto Federal Sul de Minas - Campus Machado.



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