Postado em quarta-feira, 11 de maio de 2022
às 10:10
Meio ambiente, reformas e subsídios: o que pode ser votado e o que não deve entrar na pauta do Congresso antes do recesso
Cenário eleitoral trava discussão sobre medidas como a alteração no sistema tributário e privatização dos Correios
Iniciado o mês de maio, o Congresso Nacional tem dois meses e meio de trabalho pela frente até o recesso parlamentar, que começa em 18 de julho. Essa é considerada a última janela para votações relevantes em 2022. Após o recesso, os trabalhos em plenário são reduzidos drasticamente em razão da campanha eleitoral, visto que a maioria dos deputados e boa parte dos senadores deve disputar a reeleição ou outros cargos em outubro.
Embora sejam onze semanas disponíveis para debates e votações de projetos, os parlamentares não devem apreciar reformas estruturantes que tramitam nas casas legislativas, como a modificações no sistema tributário e nas regras do Imposto de Renda. Outro tema relevante que dificilmente será pautado é a privatização dos Correios, já aprovada na Câmara, mas com dificuldades para andar no Senado.
Em contrapartida, outras propostas devem ganhar espaço, impulsionadas pelo crescente clima da disputa eleitoral. Sejam medidas provisórias do Executivo para beneficiar setores da economia e acenar para a população em geral, sejam projetos que agradem nichos específicos de eleitores identificados com o presidente Jair Bolsonaro e congressistas aliados.
Na oposição, além de barrar as iniciativas do governo, uma das metas é levar a votação na Câmara o projeto que torna crime o financiamento e a disseminação de fake news. O texto encontra resistência no Palácio do Planalto, que alega ameaças à liberdade de expressão. A proposta já passou pelo Senado, mas terá que voltar à análise dos senadores porque foi modificada pelo relator na Câmara, Orlando Silva (PCdoB-SP).
Outras matérias que ainda não estão tramitando podem entrar na pauta, como um novo Refis (programa de renegociação de dívidas com a União) e um subsídio à aquisição de itens como o combustível e o gás de cozinha. A proposta conta com a resistências na equipe econômica, mas é defendida pela ala do governo preocupada com a rejeição de Bolsonaro, fator que dificulta as chances de reeleição.
Parlamentares e analistas consultados por GZH avaliam que a proximidade da eleição inviabiliza a construção de acordos para a apreciação de propostas como a reforma administrativa, que mexe na estrutura das carreiras de servidores públicos, ou a reforma tributária, que enfrenta resistência em segmentos da economia.
— Em ano eleitoral, o deputado ou senador não quer se indispor com eleitores, possíveis eleitores ou setores econômicos que podem ser importantes na sua campanha — pondera o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa, que acompanha diariamente as movimentações do Congresso.
O analista Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), avalia que podem avançar propostas relacionadas ao meio ambiente, como o projeto que viabiliza a mineração em terras indígenas (em tramitação na Câmara).
— A questão ambiental tem mais chances de andar porque há uma pressão do governo, que está com base suficiente para aprovar projetos, pelo menos na Câmara — destaca Queiroz.
Professor da Fundação Getulio Vargas, o cientista político Eduardo Grin avalia que o período que resta até o recesso será utilizado pelo governo e seus apoiadores para galvanizar o apoio do eleitorado conservador e atender segmentos específicos.
— Serão projetos calculados pelo bolsonarismo e pelo centrão como capazes de render algum apelo público e dividendos eleitorais — sustenta.
Integrante da base governista e próximo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o deputado federal Covatti Filho (PP-RS) acredita que o governo pode obter apoio para aprovar propostas como a mineração em terras indígenas, bandeira antiga de Bolsonaro que encontra resistências entre os ambientalistas. O parlamentar avalia que a polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula (PT), verificada nas pesquisas eleitorais, pode se refletir no plenário.
— Quando chegarem pautas mais difíceis, em virtude dessa polarização, mesmo não sendo 100% da base, o deputado vai ter tranquilidade e acabar se posicionando a favor — aposta.
Vice-líder da oposição, a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) ressalta que uma das prioridades do grupo é viabilizar a votação do projeto que trata das fake news, para que as regras tenham condições de valer durante o processo eleitoral. Para isso ocorrer, o texto deve passar pela Câmara e ser votado novamente no Senado. No início de abril, os deputados rejeitaram a urgência da matéria.
— O texto que veio do Senado foi melhorado pelo relator. Acredito que teremos condições de votar a urgência novamente ou criar uma comissão especial para votar em plenário em maio ou junho — diz Melchionna.
Dono de uma base suficiente para aprovar a maioria das propostas de seu interesse na Câmara, o Planalto tem encontrado mais dificuldades no Senado. A liderança do governo na Casa está vaga há quatro meses, desde a saída de Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Carlos Viana (PL-MG) chegou a ser indicado ao posto, mas a nomeação ainda não foi publicada no Diário Oficial.
Matérias em pauta no Congresso
O que deve ser votado
Pacote trabalhista
Anunciado na semana passada, será detalhado nesta semana pelo presidente Jair Bolsonaro. Deve conter uma medida provisória (MP) para ampliar a formalização do trabalho rural e outra MP ou projeto de lei com “eixos estruturantes”, ainda não detalhada pelo governo.
Mineração em terras indígenas
Tramitando desde 2020 na Câmara dos Deputados, o projeto define regras para lavra de recursos minerais, petróleo, gás natural e aproveitamento de rios para geração de energia elétrica nas reservas indígenas. Teve regime de urgência aprovado no mês passado.
Piso da enfermagem
Estabelece um valor mínimo a ser pago a enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares e parteiras por serviços de saúde públicos e privados em todo o país. Enfrenta resistência de prefeitos, que pode ser superada por uma emenda articulada pelo deputado Fausto Pinato (PP-SP), cujo conteúdo prevê ajuda da União para o pagamento. Aprovado em novembro do ano passado pelo Senado, está tramitando em urgência na Câmara.
Mercado de carbono
Apresentado pelo deputado Marcelo Ramos (PL-AM), propõe a regulamentação do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), com mecanismo de compensação financeira para quem instituir projetos de redução da emissão de gases do efeito estufa. Está em regime de urgência na Câmara.
Licenciamento ambiental
Busca simplificar o processo de licenciamento ambiental, com a flexibilização de normas e dispensa de licenciamento para algumas atividades. Aprovado na Câmara em maio de 2021, depende de acordo no Senado para ir a votação.
O que pode entrar em pauta
Projeto das fake news
Visa diminuir a disseminação de informações falsas ou enganosas, prevendo punição aos responsáveis. Contém normas para funcionamento de buscadores, redes sociais e aplicativos de mensagem. Aprovado no Senado, foi modificado na Câmara e teve a urgência rejeitada, mas continua em debate. Embora governistas rejeitem o texto, podem aproveitar o debate em plenário para se posicionar contra o que consideram “ameaça à liberdade de expressão”.
Subsídio a combustíveis
Ainda discutida pelo Palácio do Planalto, a medida pode aliviar o impacto dos reajustes frequentes no combustível e no gás de cozinha. Impacto seria superior a R$ 100 bilhões, o que incomoda a equipe econômica. Entretanto, é visto como oportunidade para reduzir a rejeição de Bolsonaro junto ao eleitorado em geral e agradar os caminhoneiros em particular. Ao chegar ao Congresso, seria encarado como prioridade.
Novo Refis
Outra proposta que ainda não chegou ao Congresso, deve prever um novo refinanciamento de dívidas de empresas com a União. O presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou que texto deve ser encaminhado via medida provisória e ser analisado em conjunto pelas duas casas legislativas.
Homeschooling
Permite que os pais eduquem os filhos em casa ao invés de matriculá-los em uma escola. Agrada o eleitorado evangélico, um dos nichos que mais apoiam o presidente Jair Bolsonaro, mas ainda há dúvidas sobre a aprovação caso seja pautado na Câmara.
O que não deve ser apreciado
Reforma administrativa
Proposta de emenda à Constituição que altera regras para o funcionalismo e para a administração pública, foi apresentada em 2020 pelo governo. O relatório aprovado no ano passado em comissão especial permite contratações temporárias por até 10 anos e a redução da jornada de trabalho e remuneração em até 25%. Enfrenta resistências da oposição e de entidades organizadas de servidores, e está longe de acordo que possibilite aprovação.
Reforma tributária
Tramitando há quase três anos no Senado, é outra que está longe de consenso. Muda a tributação de diversos setores da economia e impacta na arrecadação de Estados e municípios. Defendida pelo ministro Paulo Guedes, não deve ir a plenário neste ano.
Privatização dos Correios
Aprovado na Câmara em agosto de 2021, o texto autoriza a exploração dos serviços postais por empresas privadas e cria condições para a privatização da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Está parado no Senado, sem perspectiva de andamento.
Reforma do Imposto de Renda*
Outra matéria que já passou na Câmara, mas está engavetada no Senado. Prevê a correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), elevando o limite de isenção de R$ 1,9 mil para R$ 2,5 mil. Ainda determina a taxação de lucros e dividendos em 15%. Paulo Guedes já falou em apresentar novamente o texto em um eventual segundo governo Bolsonaro.
FONTE: GZH
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